Será que objecto é simples de definir? Vamos passar ao dicionário, para ver a definição da palavra.
objecto
do Lat. objectu, lançado adiante
s. m.,
- tudo o que afecta os nossos sentidos;
- coisa material;
- corpo;
- matéria, assunto;
- fim;
- propósito;
- intenção;
- desígnio;
- agente;
- traste;
- Filos.,
- o elemento correlativo do sujeito no acto de conhecimento;
- o que se presta a experiência ou a conhecimento.
Parece simples, certo? Mas será assim tão simples a definição de objecto para um museu? Até pode parecer, mas certamente é diferente a forma como olhamos para uma pintura de Picasso, da forma como vemos um arado. São representações culturais da humanidade. Um ligado ao trabalho agrícola, outro às manifestações artísticas, reflexo do quotidiano e observáveis desde os primórdios da humanidade. O contexto museal de um e outro dignificam-os, mas ainda assim será que existem diferenças abismais entre eles?
Há uma diferença essencial, no meu ponto de vista. Não há um único arado, ou seja um objecto utilizado no revolver das terras que tenha a importância ou relevância que uma pintura específica pode ter. Se repararmos no significado que tem uma pintura como a Guernica, dificilmente a poderemos comparar, em termos de importância per si, a um arado específico que se encontra em exposição num qualquer museu. No entanto, o conceito de arado, isto é, um objecto que facilite a tarefa pesada que é revolver os solos, terá, ou melhor, teve a seu tempo uma relevância e importância aproximados à roda para o desenvolvimento da humanidade. Basta recordar a importância que a agricultura teve na construção da civilização moderna.
No entanto, essa mesma diferença (que me custa colocar em termos de importância), deve ou não de ser colocada na mesa quando se debatem questões com prioridade de tratamentos e restauros, de documentação, de exposição ou de qualquer outra espécie de factor que o museu tenha de ter em consideração para cumprir com a sua missão? Eu penso que deve. Mas concordo também que em alguns museus a exposição de um arado assume uma relevância maior do que qualquer Picasso que o museu possa ter nas suas colecções. O contexto em que esse objecto se insere assume uma importância ainda maior, na minha opinião.
Por outro lado e dada a imensa panóplia de objectos que encontramos nos museus (onde facilmente vemos ânforas, moedas, pinturas, instalações, escultura, alfaias agrícolas, animais empalhados, modelos, máquinas, motores, carros, enfim uma imensidão de hipóteses), há que ter em conta alguns conceitos que têm vindo a ser discutidos e que são importantes no tratamento documental dos objectos nos museus. São eles os conceitos de objecto composto e conjunto de objectos. Um e outro nunca poderão ser dissociados desta análise, mas a seu tempo abordarei aqui os seus significados.
Estes são alguns pontos que pretendia “mandar” para a praça pública com o objectivo de os ver debatidos pelos leitores que se interessem pela matéria (e já agora pelos restantes) e não esgotam, como é óbvio, todas as questões a ter em conta sobre este assunto. Entendam-nos como um ponto de partida que terá continuação.
O que é então um objecto para um museu?
Boa tarde Alexandre!
Apesar de nunca ter participado neste blog, tenho acompanhado os posts que aqui vai colocando… Esta questão pareceu-me um bom ponto de partida para iniciar a minha participação.
No meu ponto de vista, a discussão que apresenta talvez não se deva colocar dessa maneira, até porque objecto museológico não pode ser visto apenas como bem material. Não nos podemos esquecer dos bens imateriais que após a sua materialização também se tornam em objecto museológico.
Relativamente ao valor que cada um atribui a um objecto (remeto para a sua comparação entre uma obra de Picasso e um arado), penso que não pode ser isso que o categoriza como objecto museológico ou não. Até porque, como bem referiu, depende de quem vê, do contexto e, acrescento eu, do valor que lhe é dado pela instituição onde está incorporado. A raridade ou valor monetário como é óbvio podem contribuir para.
Sendo assim, para resumir o que eu entendo por objecto museológico, é todo o bem passível de ser transformado em documento que represente e interprete um dado momento e/ou a evolução social, histórica, económica e cultural da sociedade de acordo com a missão e objectivos de cada museu. Quero com isto dizer que o que é objecto museológico para um museu, poderá não ser visto como tal por outro, daí a importância das políticas de incorporação e a definição da missão e objectivos.
Espero não ter desviado o objectivo do seu post…
Cmpts, Patrícia Geraldes
Patrícia…
Era mesmo isso que pretendia quando coloquei o post aqui. Gerar discussão e daí esclarecimento ou novas ideias sobre o tema. Não pretendi colocar aqui uma definição para depois a esmiuçar com os comentários, poderia ter seguido esse caminho, mas preferi que fossem os que me leiem a fazê-lo… pareceu-me que poderia restringir a coisa à discussão de uma visão apenas.
Eu não concordo com um ponto da sua definição apenas. Se um museu vê aquele objecto como “museológico” ele passa a sê-lo independentemente de não assumir qualquer importância noutro museu. Para isso existem (?) ou deveriam existir melhores políticas de gestão das colecções e da sua circulação pelos museus existentes no país. Ou seja, se eu tenho uma peça que é importante para o museu de Freixo de Espada à Cinta e no meu museu ela não se insere em qualquer contexto, porque não a depositar no museu de Freixo de Espada à Cinta? A importância do objecto, não pode ser vista com os olhos de apenas um museu, mas sim num contexto cultural bem mais alargado.
Em todo caso agradeço-lhe o contributo. É bom saber que alguém lê e se interessa e ainda mais que pretende participar nestas discussões. E não desviou de todo o objectivo do post!
Obrigado.
Caro Alexandre,
Concordo inteiramente consigo quando diz que a importância de um objecto deveria ser vista num contexto cultural alargado. No entanto, e infelizmente, ainda vivemos uma cultura museológica em que os objectos sob a responsabilidade de cada museu são considerados como pertença do mesmo e, mesmo que tenhamos consciência da importância que teria noutra colecção, são nossos e só nossos. Ou seja, quanto mas interesse houver neles, menos possibilidades daremos para que circulem pelos outros espaços. Esta reacção egoísta tem tudo a ver com a falta de políticas de gestão e circulação como bem refere. Mas também com a crescente importância dada aos números e não a um verdadeiro estudo qualitativo de públicos. Seguindo o exemplo que disse: se o dito objecto fosse importante para o museu de freixo Espada à Cinta, mas quem o possuísse fosse um museu em Portalegre e se, essa posse, significasse mais público em Portalegre, significaria que provavelmente o objecto nunca iria para o museu em Freixo de Espada à Cinta. Espero que tenha sido clara… (e agora sim, penso que desviei um pouco o assunto do post, mas as discussões gerem isso mesmo: uma rede de relações entre factos!!!)
Cumprimentos,
Patrícia Geraldes