Há muitos, muitos anos, comecei a trabalhar no Museu de Aveiro (num estágio, imaginem lá) no serviço educativo com a amiga Maria João Mota. Na altura não questionava tanto as coisas, mas ajudado pelos colegas, pela Maria João principalmente, dei comigo várias vezes a perguntar-me “O que é um museu para uma criança?” É, talvez, a pergunta que mais nos devia ocupar. Pensar como actuar para que o museu possa contribuir para que os nossos pequenotes questionem tudo o que os rodeia.
Vem este post a propósito de uma ida minha à creche da minha filha mais nova com o objectivo de explicar à turma dela (miúdos dos 4 aos 6) o que raio é que o pai da minha princesa, ou seja eu, faz! Antes de vos contar seja o que for, devo dizer que eu tenho uma dificuldade imensa em explicar exactamente o que faço. Sou trabalhador por conta de outrém, investigador, documentalista, especialista em documentação em museus, etc. e não tenho uma daquelas profissões em que simplesmente dizemos “eu sou tal!” Tenho alguma dificuldade em dizer que sou museológo ou profissional da informação ou analista de sistemas e por isso os meus filhos terão grande dificuldade em preencher os papeís com a profissão do pai. Agora imaginem lá explicar esta enorme confusão à criançada!?
Segui a linha mais fácil. Disse-lhe que trabalhava para museus e tentei, contar-lhes uma história breve, sobre o que são os museus e o que faz a rapaziada que lá trabalha, acabando por usar alguns dos desenhos que eles fizeram previamente e tentar criar uma breve história e exposição com a ajuda deles.
Estou muito curioso por ouvir a minha pequena mais logo, mas devo dizer que me diverti como há muito não acontecia. Desde logo pelas reacções à pergunta “vocês sabem o que é um museu?” que teve respostas muito interessantes (e que nos devem fazer pensar) como “é um sítio onde se guardam coisas valiosas” ou “é um sítio onde não podemos mexer nas coisas porque está tudo muito limpinho”, mas também pela boa surpresa que tive ao ver a maioria a levantar o braço quando lhes perguntei “quem é que já foi a um museu?” Aliás, um dos pequenotes já tinha ido a quase todos os museus que mostrei, desde os Guggenheim em Bilbao e NY, até ao do Côa, passando pelo Museu da Barbie ou pelo Museu do Ar em Sintra (ficam sempre impressionados com os aviões). E quase todos eles reconheceram de forma imediata o Museu Nacional Soares dos Reis (fiquei contente, devo dizer!)
Quando passamos à parte do fazemos nos museus eles ficaram bem atentos, mas confesso que não sei se perceberam muito bem a forma que utilizei para lhes explicar. Ri-me à farta quando lhes mostrei uma foto (a que está aí ao lado) das reservas da Smithsonian e me dizem eles “xiii tanta fruta!” e “é uma venda de quê!?” porque à distância não se percebia que se tratava de uma colecção de história natural. Adoraram os senhores restauradores com ar de cientistas e óculos de aumento, ficaram vidrados com a imagem de uma exposição e com as histórias que podiam imaginar dos objectos que ali estavam e no final ficaram confusos, pelo menos pareceu-me, com aquilo que o pai da minha princesa faz na realidade.Colocar os objectos num computador? Que raio da coisa estranha que este senhor faz? Podia dar-lhe para outra coisa, não era? Sim… podia ser carpinteiro, estofador, bancário, juíz, etc.! Podia, mas não era a mesma coisa! E certamente não seria tão feliz.
Acabei a dizer-lhes, como me disseram um dia a mim, para se divertirem nos museus. Que os utilizem para conhecer o mundo a fazer perguntas! Espero que o possam fazer e que nós os ajudemos com tudo aquilo que estiver ao nosso alcance.
Um museu para uma criança, para todos nós, devia ser um lugar de conhecimento, de diversão, de perguntas, de histórias, de factos, devia ser como uma segunda casa, aberto e participativo. É um desafio grande, mas quem é que pensa em desistir?