A ler esta notícia do Público sobre o leilão das cartas que James Dean (um ídolo da minha juventude) escreveu à sua namorada de então, Barbara Glenn, em 1954 em época em que não era o mito que hoje conhecemos, relembrei-me de diversas conversas que costumo ter com a amiga Maria José Almeida sobre o que acumulamos e vamos deixar para trás quando aos cento e muitos anos partirmos.
A Zé costuma dizer que o melhor é não acumular nada para não dar trabalho a quem fica e por questões de privacidade, da nossa privacidade e eu concordo, mesmo sabendo nós que a memória deixada por muitos pode ser importante. No entanto até que ponto é que as cartas de amor trocadas entre duas pessoas (um dos actos de maior intimidade que conheço) podem tornar-se domínio público? Acham vocês que depois de mortas aquelas duas pessoas perdem o direito à sua privacidade? Serão elementos importantes para quem estuda o personagem James Dean e a sua história, mas até que ponto o estudo, a história, o entretenimento podem justificar a devassa da vida privada?
Não é o tema central deste blog (embora acredite que ainda consigo fazer algumas pessoas rir), mas não posso deixar de chamar a atenção para a talk do Carlos Moura (um stand up comediant da nova geração) no TEDx Edge de Portimão em 2010 sobre o Humor para além da comédia e para algumas verdades ditas por ele sobre a formatação da nossa sociedade.
A alteração de estatuto (perda de estatuto segundo a opinião de alguns) da Cultura no XIX Governo de Portugal aguçou-me a curiosidade sobre o programa de governo para os próximos 4 anos nesta área. Seria assim tão limitado? Algo escrito apenas para cumprir o propósito de a Cultura não passar esquecida num documento com esta importância? Qual seria o peso da Cultura em termos relativos no novo formato? E, finalmente o mais importante, que ideias, estratégias, medidas estavam ali mencionadas?
Estas dúvidas foram similares às que tive quando da tomada de posse do anterior governo e que me fizeram ler o então programa do XVIII Governo Constitucional. Se precisarem de recordar ou ler pela primeira vez podem encontrar o dito aqui. Eu precisei de recordar e devo dizer (pese embora ter sido um governo com mandato reduzido pelas circunstâncias que todos conhecemos) que dois anos depois a Cultura (uma aposta de então, se bem se recordam das palavras de José Sócrates) não teve o papel prometido pelo governo socialista. Poderão ter todas as justificações circunstanciais, mas realmente a prioridade prometida não foi de todo cumprida.
Comparando os dois programas de governo as diferenças são notórias. No anterior propunha-se o investimento e reforço do orçamento da Cultura, no actual propõe-se uma avaliação e redefinição do papel do Estado na Cultura. Nada de novo tendo em consideração uma e outra família política. O focus de um e outro centra-se em alguns eixos (obrigatórios de resto). A saber: Língua (adicionem aqui o Livro e rede de bibliotecas, etc.), Património, Artes e Indústrias criativas e Culturais. No entanto as diferenças na estratégia e medidas são também notórias.
Vejamos a questão do Património (leia-se Museus) que é a que mais me interessa particularmente. Sobre o tema está inscrito no Programa de Governo o seguinte:
Representando a herança comum de todos os portugueses, o Património tangível e o Património intangível são simultaneamente um importante factor de identidade nacional, referências fundamentais na educação dos portugueses e elementos de enorme potencial para a nossa economia. Daí a necessidade de assumir a manutenção responsável e a valorização dos museus e monumentos nacionais, a promover com as Autarquias, as Escolas e a Sociedade Civil, reconhecendo um contributo que não se esgota na sua contemplação e fruição.
No difícil período que atravessamos o governo abordará a rede nacional de Museus não numa perspectiva de criação de novas estruturas mas no sentido de optimizar os recursos existentes, valorizando a conservação, a investigação e a interacção com o público. No prazo de um ano, o Governo apresentará a sua proposta para uma nova estratégia da Rede de Museus.
Num prazo de seis meses, o Governo estudará a revisão do regime de gratuitidade dos museus, diminuindo o período da sua aplicação. Ao mesmo tempo, irá promover a discussão sobre os seus horários de funcionamento.
[…]
No prazo de dois anos, a Secretaria de Estado da Cultura apresentará o primeiro inventário-base do Património Imaterial Português.
São algumas ideias básicas que espero ver desenvolvidas e concretizadas na nova lei orgânica (prometida para daqui a 90 dias) da Secretaria de Estado para poder reflectir mais sobre elas. No entanto, posso já dizer que me agrada a ideia de uma maior participação e envolvimento das Autarquias, Escolas e Sociedade Civil na defesa, manutenção e valorização dos museus e monumentos. Se bem pensado a actual intenção do IMC em descentralizar a gestão de alguns museus é bem meritória, no entanto, não julgo que a manutenção dos quadros de pessoal e de uma certa dependência ao organismo central seja possível concretizar. Se alguém assumir a responsabilidade de gestão de um Museu, imaginemos o caso de uma autarquia, quererá, tenho a certeza disso, poder pedir responsabilidades e atribuir mérito a pessoas que façam parte das suas equipas e sobre as quais tenham responsabilidade hierárquica.
Outro aspecto importante a salientar é a abertura da discussão em torno da estratégia da Rede Portuguesa de Museus, da gratuidade dos museus e também dos horários de abertura dos museus. Junto-os num ponto apenas, porque julgo serem indissociáveis da discussão maior e importante que é a estratégia da RPM e, consequentemente, da estratégica política a seguir na museologia. Aqui, meus caros, é onde devemos concentrar toda a nossa atenção e esforços no sentido de avaliar a proposta do governo e depois discutir e apresentar as melhores propostas enquanto agentes no sector. Uma nova estratégia (que já agora não tinha nada a ver com construção de museus, mas sim com certificação da qualidade dos museus existentes e deve manter esse eixo estratégico) que possa contemplar vários aspectos e imprimir à RPM um papel bem mais abrangente do que aquele que tem hoje em dia em termos de fiscalização, atribuição de fundos, certificação de qualidade, reconhecimento e creditação de forma independente e transparente de profissionais, empresas e produtos no panorama museológico nacional.
O último ponto referido em cima levantou-me a seguinte questão: Como se vai fazer o “primeiro inventário-base do Património Imaterial Português” de acordo com o que foi apresentado publicamente no Museu Nacional de Arte Antiga no passado dia 1.
Dúvidas e algumas certezas (mais dúvidas) no entanto espero sinceramente que este governo possa ser bem sucedido nesta área. O anterior bem disse que o iria ser e podemos assistir a uma constante diminuição dos recursos disponíveis. Este assume a intenção de redefinir e restruturar, começando pelo topo, e a falta de meios, falta saber se é agora que podemos “fazer mais com muito menos”!
Acompanhem-me na visualização do seguinte vídeo, por favor.
Agora pensem comigo. Será que é esta uma boa ideia para o turismo? Que implicações terá este tipo de política chinesa para os países copiados? É positivo? Negativo? Ter o Porto ali mesmo ao lado de Shanghai faz com que os chineses queiram visitar o verdadeiro? É um roubo do património cultural alheio? Parece-lhes o mesmo do que fazer vinho do Porto a 100 Km da Cidade do Cabo na África do Sul?
A Zé Almeida enviou-me o vídeo por mail e confesso que achei a ideia um pouco idiota… se quero ver uma aldeia inglesa vou a Inglaterra e pronto, mas depois pensei um pouco mais e perguntei-me se as ocidentais ChinaTowns não serão (eu compreendo bem as diferenças e principalmente o contexto e a forma como apareceram nas nossas cidades) um pouco o mesmo? Que me dizem vossas senhorias?
Alguém muito sábio poderia ter dito um dia que para uma empresa ter sucesso é absolutamente necessário que crie uma relação com os seus clientes que lhe permita perceber as suas necessidades e apresentar soluções eficientes para as suprir. Na falta de uma citação daquelas bonitas, fica a ideia.
É de tal forma evidente aquela afirmação que só é estranho quando encontramos alguma que faça exactamente o oposto (estranho, mas não raro). Isto é, alguma empresa que esteja completamente desligada do mercado onde actua. Não é, de todo, o caso da empresa onde trabalho. A relação com os nossos clientes é algo que muito estimamos e de que temos o maior orgulho e, na minha opinião, é a prova da competência que julgamos ter.
Neste sentido, amanhã vamos dar finalmente continuidade a um projecto que ficou, por diversos motivos, um pouco parado nos últimos tempos: os Grupos de Trabalho. Para os que não conhecem este projecto da Sistemas do Futuro, os Grupos de Trabalho são fóruns de discussão (e decisão), organizados por tipos de colecções (Arte, Ciência e Técnica, Etnologia, etc.), para os quais convidamos técnicos de museus que trabalham connosco, com o objectivo de debater questões relacionadas com inventário, documentação e gestão de colecções. Desde os aspectos legais, passando pela normalização internacional e nacional, até aos desenvolvimentos tecnológicos e novas funcionalidades das aplicações tudo é discutido de forma bastante aberta e informal com o propósito de melhorar os nossos produtos e, acima de tudo, de disponibilizar ao conjunto de museus e instituições que os utilizam, soluções capazes e eficientes. Das reuniões tidas no passado saíram grandes ideias e novas funcionalidades que têm vindo a ser usadas por cada vez mais museus e resgatadas pela concorrência.
Amanhã retomaremos então este projecto com o primeiro grupo que criamos em 2007, o de Arqueologia.
Os temas a debater centrar-se-ão entre a georeferenciação do património imóvel, a organização do registo de imóveis com as suas dependências directamente associadas (ex. de um centro histórico e do conjunto de edificado que o compõe), a criação e utilização de thesauri na documentação e inventário, a ligação a bases de dados externas complementares (bibliografia, por exemplo) ou ainda questões relacionadas com a utilização de diversas línguas no registo da informação. Este grupo tem também um importante papel na discussão sobre a gestão do património imóvel dado que vários técnicos que estarão presentes têm, no âmbito das suas funções, responsabilidades na gestão do território dentro das autarquias onde trabalham.
Serão dois dias de trabalho intenso e produtivo (tenho a certeza disso) regados com a boa disposição e um jantar de convívio, como não podia deixar de ser.
Devemos é pensar na Cultura “com”: com outras áreas que valorizem o conhecimento, com sectores que promovam a criatividade, com políticas bem definidas. Em Portugal discutimos muito os nomes e pouco os objectivos.
Augusto Mateus e outros importantes intervenientes na área cultural do país, entre os quais destaco (por também concordar com a sua opinião), a ex-Directora do IPM Raquel Henriques da Silva escrevem hoje no Público sobre este importante e actual momento do sector.