Um dia tinha que acontecer! Ainda há uns tempos venerava eu o Desterrado no MNSR e pensei para mim “este sacana é tão fabuloso que não tarda a aparecer numa selfie com alguém!” Ou então acaba em vítima de um “selfie crash”!
O acidente com a escultura de D. Sebastião da fachada da Estação do Rossio é, para começo de conversa, estúpido! Não consigo compreender, por muito que tente, aquilo que moveu a vontade da pessoa que se queria fotografar ao lado do nosso rei desaparecido. Acreditem que tentei, mas escapa-me por completo aquilo que leva alguém a subir para ali só para ficar com um registo ao lado da escultura, quando poderia muito bem fazer algo parecido sem ter que despender o esforço na curta escalada! Seria certamente para fazer um “faceswap” no MSQRD, porque se fosse para provar à mãe ou à namorada que estava mesmo no Rossio bastava uma selfie sem crash! Mas todos sabemos que há um monte de rapaziada com esta propensão! E quem não sabe, veja o excelente programa “Science of Stupidity” que fica informado sobre esta franja enorme da população.
Tenho uma curiosidade enorme em saber, da boca do próprio, o que o motivou. Sinceramente acho que não tinha qualquer noção do risco e, muito menos, do valor patrimonial e histórico que a escultura representa dado tratar-se de um monumento nacional já classificado há algum tempo (certamente nem saberia que é um monumento nacional… ou se calhar desconhece o conceito de monumento nacional).
Embora perceba que este caso específico mereça a atenção da comunicação social e se devam tirar as consequências judiciais ajustadas, julgo que o caso nos deveria fazer reflectir sobre qual o valor do nosso património histórico para a nossa população e para os turistas que nos visitam. É meramente estético? Percebemos o que significa a representação da nossa história? Temos noção do que representa o património? É importante para a sociedade actualmente? É meramente ilustrativo? Ou, pelo contrário pode contribuir para mudanças sociais através de uma reflexão sobre os temas que invoca?
Em duas ou três conversas com amigos fora da área percebo que a indignação é relativa. Há quem perceba e critique o causador do “selfie crash”, há quem pergunte porque não estava a escultura presa e há quem pergunte “mas quem raio era D. Sebastião?” E vocês? O que acham sobre este caso?
Não saber o que é património; classificado ou a classificar; D. Sebastião (provavelmente um jovem bem inconsequente e manipulado, também); uma obra de arte; etc., etc., só nos mostra como o nosso sistema educativo, o que eu tive e o que continuou, anos e anos, até hoje, só relevando os popularismos, vários, conforme as épocas. Não há educação artística, estética, literária, que crie em cada um de nós capacidade crítica. Cultura, acham uns largos milhões de portugueses, é só para os “intelectualoides” e para fazer gastar dinheiro ao Estado. Má formação, desde as cadeiras da escola, que não nos ensina a reverenciar Camões ou Carlos Amarante, ou até, e porque não Santo António, filósofo e orador português de grande orgulho junto de Roma. Ou Amadeo Souza Cardoso ou Almada Negreiros ou , porque não, Saramago ou António Aleixo. Mas a culpa não é desses milhões, é dos sistemas. É uma falha, imensa, e não aprendemos nada com o passado e com o vazio do futuro que é já hoje!