Não há como descrever a sensação de perda quando vemos, em directo, através da redes sociais e da televisão, o incêndio na Catedral de Notre Dame de Paris.

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Incêndio 2019 – Notre Dame | Foto: Geoffroy Van Der Hasselt/AFP

Eu sei, agora todos nós sabemos, que a mais famosa catedral parisiense, não é exactamente uma catedral do século XII (tal qual a construíram então, pelo menos), mas sim o resultado de séculos de história, marcados fortemente pela intervenção de Viollet-le-Duc e Lassus que agora foi vemos reduzida (parcialmente) a cinzas neste grande incêndio. No entanto, todos a víamos como o local do nascimento do Gótico e a catedral de Quasimodo, celebrizada por Vitor Hugo, que era ponto obrigatório de passagem e paragem nas visitas a Paris.

Recordo-me, na primeira vez em Paris, em 2007, quando cheguei à fachada da catedral de pensar nas aulas de história de arte e da História da Arte do Janson e juntar cor à fotografia a preto e branco que ilustrava, de longe, o conjunto monumental. Ali estava ela, enorme, a alcançar os céus, como deve ser numa catedral, local de culto, celebração e de fé. Espanta-me sempre a beleza que a fé consegue produzir.

Naquela altura decorria uma celebração na catedral, não tenho a certeza se uma missa ou se outra qualquer cerimónia específica e nós ainda tinhamos muito que calcorrear em Paris, por isso entrei apenas por alguns instantes, tirei duas ou três fotografias e saí com o objectivo de ir à Shakespeare and Company. Foi a primeira e última vez que lá estive e que vi a Notre Dame. Estava certo que a reencontraria mais tarde, com mais tempo, para uma conversa mais demorada.

Não imaginava eu, e espero continuar a não imaginar com outros casos, que a Notre Dame sucumbiria num desastre como o de ontem. No entanto, já quando se deu o incêndio no Museu Nacional, sobre o qual o Gabriel escreveu aqui, é sempre nestes momentos que me assaltam as dúvidas sobre a nossa real capacidade de proteger e salvaguardar o património cultural que temos para passar à próxima geração. É sempre nestas alturas que pergunto a mim mesmo “então e se isto acontecesse na Torre dos Clérigos, na Batalha, no Convento de Cristo, em Alcobaça ou nos Jerónimos?” Será que conseguíamos travar uma tragédia destas? Ou pelo menos minimizar os prejuízos e danos causados? Temos nós planos de segurança para todos os nossos monumentos? Há meios que assegurem que todas as medidas de segurança estão activas no caso de se dar uma tragédia semelhante? E além disso, estão estes monumentos bem documentados para que, em caso de tragédia, a perda não ser total?

E o que fazer a seguir a uma perda desta magnitude? Reconstruir algo muito semelhante? Reproduzir o modelo anterior? Que métodos construtivos usar? Que materiais? Deixar a reconstrução de lado e pensar numa nova construção? Numa nova Notre Dame? Com que modelos? Quem a pensaria? Será certamente uma discussão acalorada nos próximos tempos em França, como prevê o João Pinharanda, mas não terá, estou certo também uma decisão de consenso alargado.