9º Encontro de Utilizadores – Sistemas do Futuro

9º Encontro de Utilizadores – Sistemas do Futuro

A Sistemas do Futuro organiza, de dois em dois anos, o seu Encontro de Utilizadores que tem como principal objectivo dar a conhecer os projectos que desenvolve com e para os seus clientes e parceiros e possibilitar a troca de experiências e conhecimentos com a comunidade museológica e científica na área do património cultural. Desde sempre estes encontros foram gratuitos e, ao longo dos anos, vários profissionais de museus participaram e contribuíram para a extraordinária rede de conhecimento criada à volta das questões da documentação e gestão do património.

Sessão de Abertura do 9º Encontro de Utilizadores

Sessão de Abertura do 9º Encontro de Utilizadores

Este ano o Encontro de Utilizadores, já na sua 9ª edição, foi organizado em parceria com a Secretaria de Cultura do Estado de São Paulo e decorreu no auditório desta instituição nos dias 19 e 20 de Maio. O programa foi extenso e contou com várias apresentações interessantes (recordo que a minha opinião poderá ser parcial) de projectos brasileiros e portugueses nas quais é evidente um enorme esforço das instituições para resolver questões práticas na documentação e gestão de um património vasto e riquíssimo.

Não vou, dado que esperamos em breve ter autorização para a publicação dos vídeos das apresentações, elogiar ou focar uma apresentação específica. Todas elas têm pontos muito interessantes, com soluções e problemas, com diferentes abordagens e metodologias, mas importa-me referir um ponto comum a todas elas, a importância dada às normas. Pode parecer-vos uma questão óbvia, tratando-se de documentação, mas não é. Tanto não é que ainda hoje assisto à apresentação de projectos, leio artigos e vejo online alguns produtos de processos de documentação em que a normalização existente é a mesma do que a quantidade de água no deserto de Atacama. É isso que me faz sentir que o caminho, embora longo e difícil, está a ser bem trilhado por muitas instituições com grandes responsabilidades nesta matéria.

Auditório da SEC-SP

Auditório da SEC-SP

Estes dois dias foram também um excelente momento de aprendizagem, de partilha e de construção de boas amizades com muitos colegas brasileiros que, num momento particularmente difícil, trabalham todos os dias em prol da nossa herança cultural tornando-a acessível, física e intelectualmente, à grande comunidade da lusofonia. Para ser um encontro perfeito só faltou a presença de muitos colegas portugueses que costumam marcar presença nestes momentos e dos quais senti(mos) a falta.

Espero ver todos numa próxima oportunidade.

Apelo à participação – Diagnóstico aos Sistemas de Informação dos Museus

Apelo à participação – Diagnóstico aos Sistemas de Informação dos Museus

Aproveito o texto dos colegas que estão a tratar da divulgação deste 1.º diagnóstico aos sistemas de informação dos museus para vos transmitir estas informações muito importantes e chamar a vossa atenção para a necessidade de contar com o apoio de todos para este trabalho.

“Como possivelmente é já do vosso conhecimento, o Grupo de Trabalho – Sistemas de Informação em Museus (GT-SIM), da Associação Portuguesa de Bibliotecários, Arquivistas e Documentalistas (BAD), está a realizar um inquérito aos museus portugueses no âmbito do projeto Diagnóstico aos Sistemas de Informação dos Museus.

Este projeto tem como objetivo central o levantamento e a caracterização dos museus portugueses no que diz respeito às áreas da gestão da informação dos vários tipos de bens patrimoniais.

Os resultados do projeto possibilitarão, por um lado, conhecer a realidade portuguesa atual no que diz respeito à gestão da informação dos acervos nos museus e, por outro lado, constituirão o fundamento para orientar o trabalho futuro do GT-SIM.

No final do mês de março foi enviado por correio eletrónico um convite à participação no estudo. Se por alguma razão não o recebeu por favor contate o seguinte endereço eletrónico: diagnostico.si.museus@gmail.com.

A resposta ao questionário é feita online.

A sua participação é muito importante!

Obrigado desde já pela sua colaboração.”

Não será demais dizer que o conhecimento da realidade que temos permite enfrentar melhor os desafios que temos pela frente. Chamo portanto a vossa atenção e peço a vossa paciência para nos ajudarem neste processo que será importante para todos nós.

Notícia BAD

5 motivos para ser membro do ICOM

5 motivos para ser membro do ICOM

icomcard

Uma colecção de vinhetas

Este ano, segundo as vinhetas que estão na parte de trás do meu cartão do ICOM, faz 12 anos que sou membro desta organização filiada da UNESCO que reúne mais de 35.000 membros entre instituições e profissionais de museus de 136 países/territórios, que conta com 119 comités nacionais e 30 comités internacionais dedicados a diversas áreas de interesse/estudo/investigação em museus e museologia.

Ao longo destes 12 anos aprendi imenso nesta organização, mas gostava de partilhar com vocês os motivos que justificam, na minha opinião, a adesão e manutenção como membro de uma organização desta natureza.

 

Uma lista com os meus 5 motivos

 

1. A ética profissional – O ICOM é uma rede de profissionais de museus que se assume como uma força de liderança em termos de ética profissional. Ou seja, o ICOM é a instituição que mais se aproxima das características de uma Ordem profissional, com a vantagem de o ser a nível internacional, sem alguns dos aspectos negativos relacionados com um corporativismo fechado e centrado apenas nos aspectos de defesa de determinada profissão. A publicação do Código de Ética do ICOM (PT) e a sua tradução por vários comités nacionais (recordo que a organização apenas tem 3 línguas oficiais – Inglês, Francês e Espanhol) tem permitido, ao longo dos anos, uma consistência e regulação informal daquilo que são os deveres profissionais de quem trabalha em museus.

 

2. O desenvolvimento da Sociedade através dos Museus – O ICOM é, apesar das dificuldades, um fórum de debate e reflexão com diferentes perspectivas sobre o papel social que o museu pode e deve desempenhar na sociedade actual. Promove um debate, ainda que com algumas falhas, sobre o papel de mediação que o museu deve assumir entre o património cultural e o público, tem programas associados com o turismo cultural, procura debater, recorrendo em grande medida à celebração do Dia Internacional de Museus, temas que promovem a mudança e a procura de uma sociedade mais aberta e equitativa.

 

3. A formação dos novos profissionais – O simples facto de ser uma rede de profissionais, ou seja de pares, é relevante para que alguém que se inicie na profissão se torne membro. Haverá melhor forma de aprender com o exemplo de outros colegas, com o debate que uma rede desta natureza pode promover ou com o conhecimento partilhado por colegas de todo o mundo que lidam, ou já lidaram, com os problemas que nos são colocados no início da carreira? Eu aprendi as bases sobre documentação em museus com os artigos e apresentações de outros membros do CIDOC e muito sobre outras áreas com colegas do comité nacional português que a elas se dedicam!

 

4. Normas e guias práticos – no seguimento do ponto anterior (e talvez aquilo que é mais procurado por um novo profissional o ICOM), o desenvolvimento, pelos comités internacionais de diferentes especialidades, de normas e guias práticos que nos auxiliam a cumprir com rigor as tarefas atríbuídas aos profissionais de museus. Não só dos que são reconhecidos pelo conselho executivo do ICOM, mas também por outros, de carácter mais específico, que são desenvolvidos e publicados por comités internacionais e nacionais, como é o caso da Declaração de Princípios de Documentação em Museus publicada em 2012 pelo CIDOC (e traduzida para Português pelos colegas do SISEM-SP em São Paulo, Brasil).

 

5. A rede de profissionais (e amigos) – não será o último dos motivos que poderia ainda apontar, mas é, talvez a par da ética profissional, um dos mais relevantes para mim. Ao longo deste ano conheci e aprendi com inúmeros profissionais de museus de todo o mundo que me fizeram olhar para a minha profissão de forma mais aberta e abrangente. Conhecer pessoas de outras latitudes e longitudes, com outras expectativas, com formação distinta, das mais diversas culturas fazem-nos crescer a nível profissional e, principalmente, a nível pessoal. Em boa verdade, nestes 12 anos, conheci profissionais de países como o Bangladesh, Japão, Chile, Quénia, Zimbabwe, África do Sul, Angola, Moçambique, Brasil, Espanha, Reino Unido, Suíca, Alemanha, Estados Unidos da América, Canadá, França, Estónia, Índia, Rússia, Itália, Grécia, Marrocos, Emiratos Árabes Unidos, Austrália, Eslovénia, Dinamarca, Roménia, Bulgária, China, entre outros. Também nestes 12 anos e por conta da participação em conferências internacionais do CIDOC ou noutros fóruns que conheci através do CIDOC estive em e conheci (ainda que brevemente) países como o Chile, a Roménia, a Grécia, o Reino Unido, o Brasil ou a Alemanha e fico roído por não poder ter ido no ano passado à Índia! O que aprendi com essas pessoas e nestes países dá-me uma visão mais completa sobre as exigências da minha profissão! Os amigos que fiz nestas andanças, fazem de mim, sem qualquer falsa modéstia, muito melhor pessoa.

 

Certamente poderia apontar mais motivos. Estes são os 5 primeiros que me ocorrem sempre que me perguntam porque faço parte do ICOM e, porventura, não serão os que vos farão aderir ao ICOM ou os que fazem com que outros membros se tenham inscrito e se mantenham membros, mas se precisarem de outros poderão ver as 3 razões que o próprio ICOM aponta para ser membro (entre elas há descontos nos museus e nas lojas dos museus) e, ainda, o facto de ser dada preferência às inscrições dos membros em eventos tão interessantes (e importantes) como a conferência internacional “Museums: one object, many visions?” que terá lugar no Museu Nacional de Arqueologia, em Lisboa, no próximo dia 22 deste mês e que trará a Portugal o presidente do ICOM.

Se este texto suscitou o vosso interesse em ser membro do ICOM, vejam como podem fazer a inscrição e as condições exigidas aqui.

Brasil – Um retorno sempre feliz

Brasil – Um retorno sempre feliz

A máxima, completamente inútil, que nos diz que não devemos voltar a um lugar onde já fomos felizes é absurda! Não o fazer é exactamente o mesmo que não comer uns ovos moles em Aveiro, com medo que não nos saibam exactamente como os que provamos pela primeira vez, ou seja, é ridículo.

Esta foi já a quarta visita que tive oportunidade de fazer ao Brasil. A primeira, é justo dizê-lo, foi a melhor. Estava de férias a celebrar um dos momentos mais felizes da vida pessoal! As restantes foram todas a trabalho, no entanto, permitiram-me descobrir um novo mundo, conhecer novos amigos, ver uma realidade diferente, aprender… É isso mesmo, aprender é o que tenho tido a oportunidade de fazer nestas minhas idas ao Brasil.

A última decorreu no final do mês passado e príncipio deste e possibilitou um novo pin nas cidades visitadas: Goiânia, capital do estado de Goiás, ali a a 200 km de Brasília. Uma cidade pequena no Planalto Central brasileiro com “apenas” um milhão e meio de habitantes onde tive a oportunidade de conhecer um pouco do imenso trabalho que uma Universidade local está a realizar no âmbito da reorganização dos seus museus. A visita foi curta, mas muito interessante porque percebi algo que depois confirmaria durante a restante semana e meio de trabalho: uma preocupação imensa com a gestão das colecções e com a sua segurança e salvaguarda, reflectida num investimento sério nos equipamentos que as permitem.

Pormenor da reserva técnica

Imagem: Reserva Técnica do Museu Antropológico da UFG

Vista do Rio de Janeiro

Cidade Maravilhosa

A segunda paragem foi na Cidade Maravilhosa: Rio de Janeiro! O programa incluía uma paragem na UNIRIO¹, para uma palestra no mais antigo curso de Museologia do país (uma honra e um prazer para este vosso amigo), e a participação no seminário do COMCOL Brasil sobre Gestão e Desenvolvimento de Colecções. Sobre este evento escrevi um texto que será publicado no próximo boletim do ICOM Portugal (colocarei aqui o link assim que tiver sido publicado) e não me alongarei mais do que o necessário para dizer que foi interessante ao ponto de me ter decidido a mudar a segunda filiação nos comités internacionais do ICOM para o COMCOL. Já sobre a palestra, ou aula, na UNIRIO gostaria de referir uma ou duas coisas.

A museologia no Brasil teve nos últimos anos um desenvolvimento assombroso. Há um investimento forte na formação nesta área e têm surgido diversos cursos (licenciaturas, bacharelatos, mestrados e mais recentemente doutoramentos), acompanhando, de resto, um investimento notório na criação de novos museus, na restruturação de museus existentes ou mesmo na definiçãode políticas para os museus e colecções, por parte dos organismos federais, estaduais e municipais responsáveis. Desse investimento resultou, ou está a resultar, uma comunidade de profissionais de museus muito capaz, com formação técnica elevada, com acesso à profissão em diversos museus ou projectos de museus (ao contrário do que acontece por cá) e, em boa parte, com apoios para a participação em fóruns de discussão internacionais das mais diversas áreas envolvidas na profissão. Este desenvolvimento, como é óbvio, não resolve ou resolveu todos os problemas da comunidade museológica brasileira. No entanto, quando nos sentamos numa sala com 30 pessoas (professores, alunos, colegas de museus, etc.) a conversar sobre os desafios que os museus enfrentam na gestão e documentação das suas colecções, é fácil perceber as vantagens que o investimento trouxe para os museus no Brasil e também facilita prever um futuro muito risonho para o sector, mesmo tendo em conta as dificuldades que o país atravessa agora.

Além destes pontos positivos, muito relevantes na minha opinião, percebi também alguns pontos em comum com a realidade portuguesa. Um deles, se calhar o mais óbvio, é a utilização da “crise” como desculpa para limitar ou mesmo eliminar o investimento que estava a ser feito no sector.

No final deste encontro na UNIRIO, antes de um “happy hour” no Sofitel em Copacabana e de um jantar de amigos no restaurante Majorica (aconselho vivamente), anotei no meu caderno de viagem: “muito interessante o que me falaram sobre a realidade dos museus brasileiros. Seria muito interessante discutir, no âmbito da CPLP e comités nacionais do ICOM desses países, o que nos preocupa, une e afasta. Será que poderíamos concertar esforços para pressionar o ICOM internacional nos nossos interesses comuns, por exemplo?”

Vista de São Paulo e do Parque Ibirapuera

São Paulo

O restante tempo desta viagem ao Brasil foi passado em São Paulo em trabalho imersivo e intenso, sobre o qual falarei com mais detalhe no futuro, com amigos e colegas do Museu da Imigração, do Museu da Casa Brasileira e da Pinacoteca.

Destes três museus só conhecia a Pinacoteca (Pina para os amigos) e já tinha falado sobre este impressionante museu de São Paulo aqui, mas desta vez tive a oportunidade de conhecer um pouco mais e perceber a enorme e competente equipa que o museu tem. Um privilégio devo dizer.

Na última visita tinha marcado como coisas para fazer a visita ao Museu da Imigração, mas na visita que tive a oportunidade de fazer agora, percebi porque não o fiz. É um museu mais deslocado do centro, na zona leste de São Paulo, com um acesso mais complicado porque fica numa rua que é interrompida a meio pela ferrovia. O táxi que me levou lá demorou quase uma hora a encontrar o museu, mas devo dizer que entramos na rua do Museu, do lado errado da ferrovia, passado 20 minutos de sair do hotel 🙂

Apenas queria deixar uma nota sobre o museu: este é um dos poucos museus que São Paulo não pode dispensar nunca. É uma cidade que é construída por diversas vagas de imigração ao longo dos séculos e por isso é mais do que necessária a existência de um museu que tem a seguinte missão:

Promover o conhecimento e a reflexão sobre as migrações humanas, numa perspectiva que privilegie a preservação, comunicação e expressão do patrimônio cultural das várias nacionalidades e etnias que contribuem para a diversidade da formação social brasileira.

O Museu da Casa Brasileira explora as temáticas da arquitectura e design. É casa de um dos mais reputados prémios de design no Brasil, o Prémio Design MCB. Está neste momento instalado numa antiga residência de Fábio da Silva Prado, antigo Prefeito de São Paulo, situada numa zona de ampliação da cidade decorrida na primeira metade do século XX na zona do Rio Pinheiros. É um museu onde conseguimos ter uma visão sobre a história da casa brasileira, do design e, ao mesmo tempo, de uma parte muito interessante da história de São Paulo. Aconselho vivamente a visita.

Em cada um destes museus tive a oportunidade de aprender muito sobre a história de São Paulo e do Brasil. Como disse acima, estas viagens têm sido momentos muito interessantes de aprendizagem e partilha. Fazem-me sempre pensar nas razões que nos levam a esquecer de ensinar e estudar a História do Brasil após a declaração de independência e no quão útil seria a ambos países uma maior partilha sobre a nossa raiz cultural comum.

Queria, por fim, deixar uma recomendação para quando visitarem São Paulo. Não deixem de ir assistir a um concerto à Sala São Paulo. Eu já o queria ter feito noutra altura, mas não consegui. Desta vez tive a oportunidade de assistir a um concerto da orquesta residente e de comprovar a beleza visual e a impressionante acústica de uma das melhores salas de música do mundo.

Sala São Paulo

Sala São Paulo


1 Um especial agradecimento ao Gabriel Bevilacqua Moore, colega do CIDOC e à Elizabete Mendonça, professora na UNIRIO pelo convite.

 

Municipalização dos museus do extinto IMC

Municipalização dos museus do extinto IMC

É oficial! A partir do próximo dia 1 de Agosto teremos um museu do extinto IMC (Instituto dos Museus e Conservação) tutelado por uma Câmara Municipal. A notícia não é nova e já há algum tempo o assunto era comentado em diversos meios (redes sociais, conferências, encontros, jornais, etc.) e a tutela da Cultura já tinha assumido que seguiria esta linha de actuação em todos os casos onde houvesse demonstração de interesse por parte das autarquias.

Em causa está o Museu de Aveiro, frequentemente chamado Museu de Santa Joana em Aveiro, muito por causa da ligação umbilical que os aveirenses, cagaréus ou ceboleiros, têm com a a santa padroeira da terra, a filha de Afonso V, Princesa Santa Joana que está sepultada no coro baixo do antigo Convento de Jesus, actual Museu de Aveiro. Devo dizer, antes de mais, que a minha relação com este museu poderá prejudicar a minha objectividade na análise desta questão, mas tentarei, acima de tudo, transmitir as minhas reflexões sobre o tema (municipalização dos museus) sem particularizar mais do que o necessário.

A dança das tutelas

Em Portugal sofremos de uma forte necessidade de alterar as coisas. Fazemos estas alterações de forma constante, e grave, em diversos sectores. Na educação fazemos reformas de ano para ano, na saúde é tão constante que eu fico perdido sem saber o que chamar ao Centro de Saúde da minha área de residência, o sistema fiscal muda de tal forma que de ano para ano temos que fazer uma especialização em fiscalidade para perceber que impostos devemos pagar, quando devemos pagar e por que meios os devemos pagar.

A Cultura não é, infelizmente, excepção. Desde que trabalho em museus (1996) já tivemos a tutelar os museus e a política museológica nacional o IPM (até 1992 existia o IPPC), o IMC e agora a DGPC. Mudamos, em menos de 25 anos, de uma política que centralizava todo o património histórico e cultural numa só tutela, para políticas definidas para cada área específica (IMC, IPPAR, IPA, etc.), e depois voltamos ao local de partida. Fizemos esta mudança apenas, em meu entender, por motivos financeiros e sem qualquer avaliação ao trabalho realizado no modelo prévio. Seria aquilo que poderíamos chamar de política do cofre cheio ou cofre vazio. Estando cheio criamos novos organismos, mais específicos, estando vazio, toca a encolher o estado, porque é gordo e tem colesterol, mas nem sequer vemos se é colesterol bom ou mau. Corta-se e pronto!

Nesta dança de tutelas, motivada agora por questões financeiras, o estado central encontrou o pretexto ideal para desagregar o conjunto de museus que era tutelado pelo IMC: a descentralização! Um dos chavões políticos mais caros para o bolso dos contribuintes e dos que menos resultados tem dado, se verificarmos, a título de exemplo, a autonomia limitada das direcções destes museus. Nessa tentativa de descentralização entendeu-se que seria melhor que alguns museus, deveriam ser tutelados pelas Direcções Regionais de Cultura (um organismo descentralizado que depende directamente da Secretaria de Estado da Cultura) tendo em conta o carácter menos significativo desses museus. A justificação dada era exactamente essa: esta alteração organizativa “Permite que nos concentremos nos museus mais significativos“.

Nem sequer entrarei aqui na velha questão da geografia associada aos museus “mais significativos”. É um facto com que vivo bem, devo dizer. Mas contesto veementemente a classificação arranjada para justificar esta mudança tutelar. E contesto, da mesma maneira, uma mudança em que a tutela se mantinha (todos se mantinham dependentes da SEC), mas que introduzia critérios de gestão, programa, políticas, etc. distintos de acordo com os interesses, políticas e perspectivas de cada Direcção Regional de Cultura, sem que um organismo mais especializado na área do património cultural (que tem como obrigação definir e implementar a política museológica nacional) tivesse uma palavra a dizer, pelo menos formalmente, no que diz respeito a museus dependentes do estado central.

A minha posição nesta matéria não é, devo dizer, contra uma reorganização administrativa dos museus e das suas tutelas. Devo dizer até que é/era bastante favorável a essa reorganização do “tecido museológico português”, no entanto, não me acredito que esta possa/deva ser feita de forma fechada, sem a participação de directores, profissionais, associações do sector, tutelas (estado central, direcções regionais, autarquias, empresas, associações, fundações, etc.) e sem uma discussão participada pelo maior número de cidadãos interessados nesta matéria.

A municipalização dos museus

As autarquias não são o mal da nação! Aliás eu sou um defensor acérrimo do papel das autarquias actualmente e do papel importantíssimo que desempenharam ao longo da História do país. Conheço várias que têm feito um trabalho notável na área e de cabeça poderia citar os casos de Penafiel, Santa Maria da Feira, Portimão, Seixal, Vila Franca de Xira, Ílhavo, entre alguns outros como exemplos internacionais de sucesso. Vejo com naturalidade o desejo dos autarcas e das populações de determinado concelho de criar museus e instituições que preservem e promovam a sua história, tradições e cultura. Vejo-o ainda com mais naturalidade se esse desejo se incluir num plano maior de desenvolvimento do território, no qual o museu é uma das peças, juntamente com a oferta turística, as condições de alojamento, a preocupação com a educação, etc. Portanto não vejam neste meu texto, qualquer opinião menos favorável aos museus municipais ou à tutela municipal dos museus, certo?

Pese embora essa minha opinião favorável sobre as autarquias, não posso estar de acordo com o processo de municipalização dos anteriores museus tutelados pelo IMC e procurarei, de seguida, explicar as minhas razões de forma sucinta.

Em primeiro lugar a minha discordância tem a ver com o caracter e propósito de diversos museus que poderão vir a passar pelo mesmo que acontece em Aveiro. O Museu de Aveiro e as suas colecções, bem como o Museu Regional de Arqueologia D. Diogo de Sousa (que não sei se poderá passar por este processo também), ou mesmo os museus da Guarda e de Lamego têm nas colecções bem mais do que uma representação do território concelhio em que se situam. No caso de Braga, se bem me recordo, as suas colecções integram um conjunto de bens arqueológicos de todo o norte do país. Ora imaginem que, apenas por casmurrice, que uma das autarquias do norte do país não concordasse com que a gestão de património arqueológico encontrado no seu território fosse feita por uma autarquia vizinha. Não teria direito a pedir a restituição desse espólio? Quem fala de arqueologia poderia falar sobre outro tipo de património. Esse caracter regional, nalguns casos mesmo nacional, do museu e das suas colecções é um dos obstáculos que encontro neste processo.

Um segundo ponto tem que ver com uma “canibalização” dos museus já tutelados pelas autarquias interessadas neste processo. Em Aveiro, por exemplo, o que acontece à restante rede museológica do concelho? O Museu da Cidade de Aveiro fica em que ponto, como se posiciona, agora que entra na rede o Museu de Aveiro? Dir-me-ão que são museus distintos, que um não é um museu da cidade, mas isso leva-nos ao caracter do museu e sobre essa questão falei no parágrafo anterior. São diferentes sim, mas por isso é que eu acho que dificilmente podem ter a mesma tutela, mantendo as características actuais. Haverá casos, como as Caldas da Rainha ou a Nazaré, em que a questão não se colocará da mesma forma, mas não os conheço tão bem para afirmar que uma tutela municipal possa ser viável. No entanto, julgo que o Museu José Malhoa ou a Casa-Museu Anastácio Gonçalves teriam a ganhar se estivessem sob uma mesma tutela, não vos parece? Ainda que fosse a Direcção Regional de Cultura…

Por último, a minha discordância com esta alteração de tutelas, prende-se com a falta de visão estratégica de médio e longo prazo para os museus. Não é mal de que o país padeça só com este governo, antes pelo contrário, mas este governo e a reacção à crise económica contribuiu para um desinvestimento total no sector dos museus e, consequentemente, para uma delapidação do bom trabalho que a Rede Portuguesa de Museus fez (e poderia estar a fazer).

Apenas como nota final, esperando que seja apenas uma nota final, notem que a reunião da Câmara Municipal de Aveiro na qual se aprovou, por votação, a delegação de competências no município, não contou com a presença do vereador da cultura de Aveiro tal como é noticiado aqui. Será de nos preocuparmos?

* A Associação de Amigos do Museu de Aveiro é também contra este processo. E os argumentos parecem-me também de ter em conta.

 

Imagem: David Machado (Own work) [CC BY-SA 3.0], via Wikimedia Commons

Design, tecnologia, comunicação e museus – MUX.2015

Design, tecnologia, comunicação e museus – MUX.2015

Nunca um título de um post meu resumiu de forma tão linear alguns dos tópicos que mais me interessam. Design, tecnologia, comunicação em museus é o tema do MUX.2015 – Museus em experiência que terá lugar na Universidade de Aveiro (com entrada livre… toca a aproveitar) nos próximos dias 29 e 30.

Este encontro, que é uma organização conjunta do DECA – Departamento de Comunicação e Arte e dos Serviços de Biblioteca, Informação Documental e Museologia da UA, pretende “… reunir especialistas, investigadores e profissionais nas áreas da museologia, do design, das ciências e tecnologias da comunicação para debater e refletir sobre o presente e o futuro da relação entre a museologia e da museografia em Portugal.” E como se tal não bastasse para despertar o vosso interesse, acrescenta ainda a organização: “A integração a montante do design e das tecnologia da comunicação nas estratégias museológicas é cada vez mais determinante para cativar e envolver novos públicos de uma forma mais interativa com os artefactos, os temas e as narrativas museológicas.”

Do programa permitam-me que destaque (sem qualquer desprimor para as restantes intervenções) a participação de Sam Brenner (Interactive Media Developer na Cooper Hewitt, Smithsonian Design Museum) pela oportunidade de ouvirmos alguém de uma instituição que tem sido determinante na mudança de paradigma na relação entre museus, web e tecnologia (incluíndo aqui também o design e a comunicação). No entanto, há mais… muito mais e com a elevada qualidade com que o DECA nos tem vindo a habituar.

Eu estarei por lá a falar sobre o futuro do SPECTRUM PT (a seguir ao almoço e antes do intervalo é uma maldade que me fazem) e espero pela vossa presença e contributo para o debate que possa suscitar a minha intervenção.

Não percam!